Mãe dedica sua vida para cuidar da filha que ficou tetraplégica e fazer justiça pelo que aconteceu
Mãe e filha estão ligadas para sempre por dois sentimentos: amor e dor.
O ano era 2012, Paloma de Souza Ventura, 25, e sua filha de 1 ano e dois meses estavam sendo aguardadas pela então, auxiliar administrativa, Sara Ribeiro de Souza, 47 anos, para celebrarem o Dia das Mães juntas.
Mas, em vez de lindos momentos juntas, Sara recebeu de presente uma ligação com uma notícia horrível. Paloma havia sofrido um acidente de carro em Amargosa, na Bahia.
Em consequência do acidente Paloma sofreu traumatismo craniano, ficou tetraplégica. E com sequelas como disfagia (dificuldade de deglutição), alterações esfincterianas (dificuldade de controle urinário e intestinal) e convulsões.
Ela, tinha acabado de ser aprovada para cursar Administração. Mas depois do acidente, isso não foi possível. E ela só vive graças à dedicação exclusiva da mãe. A sua filha fica aos cuidados da avó paterna.
Para Sara foi muito duro aquele Dia das Mães. Mas, hoje, a vida dela é Paloma. A dor fortaleceu ainda mais o amor da mãe pela filha. Ela queria muito que a filha estivesse numa outra condição. Mas ela dá graças a Deus que ela sobreviveu a essa tragédia.
No último dia 30, uma audiência sobre seu caso foi realizada. Paloma participou da audiência por videoconferência em sua cama. Ela não fala, mas consegue responder. Ela respondeu positivamente quando foi questionada se o ex-namorado tentou matá-la, jogando-a para fora de carro em movimento naquele Dia das Mães, em 2012.
O empresário Cícero Leandro Silva Barreto responde pelo crime em liberdade.
Segundo dados do TJ-BA, somente nos dois primeiros meses deste ano, 722 processos relacionados a agressões contra a mulher tramitavam em 58 comarcas do estado. No mesmo período, foram 644 medidas protetivas.
Acidente
Paloma e Cícero, dono de dois supermercados em Amargosa, se conheceram no final de 2011. Sara relata que ele era muito possessivo. Paloma passava mais tempo na casa dele lá, em Amargosa, do que com ela, em Tancredo Neves. Se ela esquecesse o celular desligado, ligava para casa da família de madrugada. Quando a via, não a encarava nos olhos.
Naquele 12 de maio de 2012, apesar da programação para o Dia das Mães, Cícero chamou Paloma para uma festa. Ela aceitou e deixou a filha, fruto de outro relacionamento, com a irmã. Horas depois, veio o suposto acidente.
À época, os médicos disseram que o quadro era grave e Paloma foi transferida para o Hospital Geral do Estado, onde fez cirurgias e passou 60 dias em coma.
“No dia do acidente, Cícero sumiu. Soubemos que ele ligou para um amigo e disse que houve uma discussão e que Paloma se jogou do carro em movimento. Depois de três dias, ele se apresentou com advogado na delegacia”, contou Sara.
A mãe de Paloma disse ainda que, na tentativa de se livrar de provas, Cícero vendeu o carro. Em depoimento, o comprador disse que, mesmo o carro tendo sido lavado, ele encontrou vestígios de sangue, além de um defeito na porta do carona. Cícero é acompanhado pela Defensoria Pública do Estado, a reportagem do CORREIO não o localizou.
Rotina
Esta semana, quando recebeu a reportagem, Sara marcou a entrevista para as 9h. Mesmo assim, estava de pé desde as 5h para dar os medicamentos na hora certa à filha, um anticonvulsivante e um remédio para proteger o estômago dos efeitos da medicação: “Também dei banho nela e o café. Os alimentos são liquidificados, peneirados e depois administrados através de uma sonda. Essa é a minha rotina de todas as manhãs”.
Nas segundas, quartas e quintas, recebe em casa uma fonoaudióloga e uma fisioterapeuta através de um programa do governo. Um processo de desospitalização, por força de uma liminar.
Entre 14h e 23h, Paloma toma mais dois anticonvulsivantes, faz refeições e, ainda, um antidepressivo. “A depressão de Paloma se deu pela situação na qual se encontra. Ela tem consciência de tudo, sabe de tudo que está ao seu redor”, explicou Sara.
Quando recebeu a notícia de que a filha estava tetraplégica, Sara não reagiu diferente. “Entrei em pânico como qualquer outra pessoa estaria. Acreditava que a vida de minha filha tinha sido ceifada. Só pensava: Paloma ia ter uma vida vegetativa. Na ocasião, ela passou por uma cirurgia e, quando saiu da UTI e foi para a enfermaria, foi aí que ficha caiu”, contou.
Inicialmente, ela tentou conciliar os cuidados com Paloma e o trabalho, mas não deu certo. Acabou demitida. Para os cuidados com a filha, ela conta apenas com um salário mínimo do Benefício de Prestação Continuada. Paloma também não tem plano. O jeito é contar com ajuda de amigos e familiares.
Sonhos
O maior sonho de Sara é ver sua fila andar novamente. O restante ela vai ajeitando e entregando a Deus. Inicialmente a mãe rezava para que ela falasse. Cinco anos depois do acidente, ela surpreendeu Sara e disse: ‘minha mãe’. Foi muita emoção. Aquilo para a mãe foi um sonho realizado.
Há dois anos, o quadro clínico vem progredindo. “Antes, ela tinha um olhar parado. Hoje, ela já consegue pronunciar as palavras ‘sim’ e ‘não’. Consegue movimentar a cabeça e mexer os olhos, graças às sessões constantes de fisioterapia e fonoaudiologia”, explicou Sara.
Audiência
Na última terça-feira (30), quase sete anos após a tragédia, Paloma Ventura participou de uma audiência no Fórum Criminal de Sussuarana. Mas ela não esteve no local. Através do Skype, ela, de casa, respondeu às perguntas de um juiz, um promotor, do assistente de acusação e da defesa do ex-namorado Cícero Leandro Silva Barreto, acusado de tê-la jogado do carro em movimento no dia 12 de maio de 2012.
A mãe de Paloma, Sara Ribeiro, que acompanhou toda a audiência, contou que, através de gestos, movimentando a cabeça e o polegar, Paloma respondeu a todas as perguntas.
“O juiz perguntou se ela tinha consciência dos fatos que aconteceram, ela balançou a cabeça dizendo que ‘sim’. Perguntou se ela foi agredida dentro do carro e ela balançou a cabeça afirmando. Ele perguntou se ela tinha se jogado e ela disse que ‘não’. Perguntou se tinha sido empurrada, ela disse ‘sim’”, relatou a mãe.
Mas foi na pergunta do advogado de defesa que Paloma não hesitou. “Ele perguntou: ‘Cícero tentou te matar?’. Mal ele terminou de completar a frase, ela balançava a cabeça num ‘sim’ e levantou o polegar sinalizando positivamente”, contou Sara.
Todavia, agora, a defesa de Paloma aguarda a reconstituição do caso. Segundo o advogado da família Messias de Oliveira, o juiz já deferiu o pedido. Falta só marcar a data.
“Não é vingança. É Justiça. Que esse homem vá para a cadeia. Não vai pagar o que ela vai ter para a vida dela, mas no mínimo vai impedi-lo de agir da mesma forma com outras mulheres”, disse Sara.
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